"Foi nos bailes da vida
ou num bar em troca de pão
que muita gente boa pôs o pé na profissão
de tocar um instrumento e de cantar
não importando se quem pagou quis ouvir
(Nos Bailes da Vida - Milton Nascimento)
Não, o blog não é sobre Milton Nascimento. Acho que ainda estou sob efeito do impacto que me causou ver o coitado do japonês daquele jeito, e quando tento pensar em um trecho de música só me ocorre Milton.
Coloquei isso aí porque pretendo falar um pouco sobre mim. Não muito. Minha intenção é falar um pouco sobre as pessoas que vejo nos lugares em que me apresento e contar as histórias que invento sobre elas. Só que achei que o modo como comecei está errado. Vocês não me conhecem e eu já chego contando histórias, sem falar quase nada sobre mim.
Bom, que eu toco música brasileira em bares e que não sou gay vocês já sabem. Toco meu violão por aí há uns treze anos. Esse negócio do Milton de "muita gente boa pôs o pé na profissão" não se aplica a mim: Sou músico de boteco e sempre serei músico de boteco. Não tenho pretensões além disso. Sou um cantor mediano e violonista medíocre. Ouvido absoluto? Nem sei o que é isso. Teoria musical? Nunca vi. Muita gente que começou quando eu já estava na estrada hoje faz sucesso, e eu continuo na mesma. Não os invejo, sei que são muito melhores que eu.
"...não importando se quem pagou quis ouvir": os freqüentadores desse tipo de lugar quase nunca querem ouvir mesmo. Você toca e canta com afinco, às vezes é até uma música que foi ensaiada por semanas antes de ser apresentada, e quando termina não ouve nada além do tilintar dos copos e dos gritos de "Garçom!". Não que eu espere outra coisa, meus tempos de terminar uma música e esperar ouvir aplausos já passaram. Começo logo outra e continuo criando as histórias na minha cabeça, como se não estivesse ali. Vez por outra alguém puxa um aplauso e outros, relutantes, acompanham. Não sei se gosto muito disso, ser aplaudido por piedade, mas também não ligo.
Às vezes surge um cara novo. Ele senta nesse banquinho duro e desconfortável (dia desses eu descrevo com detalhes como foi tocar depois da operação das hemorróidas. Não é nada engraçado). Mas esse cara novo chega, pega o violão, ajusta o microfone, faz aquela ceninha desnecessária de testar o som e começa sua apresentação. Não sei o que acontece. As pessoas começam a prestar atenção. Aplaudem espontaneamente no final da primeira música. Lamentam-se -- "Ahh..." -- quando ele diz que vai fazer uma pausa. Depois de um tempo, esse cara já tem uma pequena comitiva de admiradores, que vão aonde quer que ele vá se apresentar. Sei lá o que é isso. É talento, claro. É técnica, óbvio. Mas já vi gente tocando uma música cheia de acordes dissonantes e passagens complexas e não receber nem um olhar mais atencioso. Aí chega um cara desses, toca a mesma música com sol-dó-ré-mi menor e é ovacionado. Existe algo mais que eu não sei explicar, algum tipo de energia que conquista e seduz as pessoas.
Não sei como funciona, mas de uma coisa já estou bem certo: Eu não tenho isso. É bom conhecer os próprios limites.
Bom, acho que vou parar por aqui. Vou tocar essa música, Nos Bailes da Vida, hoje à noite e preciso treinar um pouco. Sei que é em ré e na parte do “... em troca de pão” vem um ré com sétima maior. Mas tem um acorde de passagem aí no meio que eu não consigo achar. Aliás, se alguém puder ajudar, agradeço. Como disse, sou um violonista medíocre.
''Mas não tem nada não
tenho meu violão''
(Cotidiano nº2 - Toquinho & Vinicius)
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