''Mas não tem nada não
tenho meu violão''

(Cotidiano nº2 - Toquinho & Vinicius)

17.9.02

”Me larga, não enche,
você não entende nada
e eu não vou te fazer entender.”

(Não enche - Caetano Veloso)

Nem o diabo entende as mulheres. Semanas depois de tudo acabado — minha vida já voltando aos eixos, tocando no bar e no puteiro, a ausência de Luiza consumindo às vezes todo o oxigênio do apartamento — E a Marininha resolve me telefonar:
— Oi.
— Oi. Quem é?
— Sou eu. Marina.
— Ah. Oi, Marina.
— Estava pensando em você, resolvi ligar.
— Ah, que legal.
(Agora já ligou. Tchau.)
— Tá tudo bem com você?
— Tudo beleza. E com você?
— Ai, mais ou menos. Saudade. Você me odeia?
— Imagina!
(Mas se você me comprar um violão novo eu agradeço, tocar esse Giannini barato está acabando com a minha reputação)
— A gente precisa conversar...
— Já estamos conversando, Marina.
(BOA!)
— Hum... E aí, como você está? Continua tocando?
— Sim. Olha, não posso ficar muito tempo no telefone. Cê ligou pra que mesmo?
— Puxa, não precisa ser agressivo.
— Agressivo? Eu? Não me lembro de ter tentado amassar o pandeiro na sua cabeça, ao contrário do que você fez com meu violão.
Como eu já esperava, começou a chorar. Perfeito, ótimo! Podem me acusar de bruto insensível, mas o choro feminino não me comove. E menos ainda quando acompanhado de balbucios lamentosos.
— Eu... Eu... Eu sei que eu fiz besteira. É que... Que eu sou muito ciumenta, sabe? Mas... Mas...
— Marina, preciso ir. Liga quando você estiver mais calma.
— Você precisa me escutar! — Passando do choro ao ódio — Tivemos uma história juntos, você não pode ignorar isso, não pode, não pode, não pode! Você não tem dignidade?
— Eu tinha, mas agora que sou obrigado a trabalhar um violãozinho vagabundo acho que minha dignidade já era.
— Ah, pra você é só isso que importa, não é? Sua vida, sua música, seu violão...
— Basicamente sim.
— Quanto valia aquela porcaria?
— Aquela porcaria era um Fender Clássico! Investi mil reais nele!
(Mentira. Oitocentos reais.)
— Então tá. Amanhã mesmo vou depositar mil e duzentos reais na sua conta. Está feliz agora?
— Ôpa! Muito.
— Eu te odeio, sabia?
E desligou na minha cara. Tudo bem: Três dias depois tirei o extrato da conta e havia um depósito de mil e duzentos reais. Comprei um Yamaha por seiscentos e paguei o aluguel atrasado com o resto do dinheiro. Ah, as mulheres...

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